domingo, 12 de janeiro de 2014

Empresas públicas e reguladores arriscam violar lei dos duodécimos

Além de diversas empresas públicas, também há reguladores que não vão seguir a lei no pagamento de metade do subsídio de férias ao longo do ano, apesar de estarem abrangidos pelo Código do Trabalho. Especialistas em direito laboral defendem que, se estas entidades optarem por pagar o 14º mês de uma vez só, estarão a violar o diploma dos duodécimos e a incorrer numa contra-ordenação muito grave. Tal como o PÚBLICO noticiou terça-feira, as empresas públicas e as entidades reguladoras têm de respeitar este ano a Lei 11/2013, renovada no Orçamento do Estado (OE) para 2014, que estabelece a diluição de 50% do subsídio de férias, como acontece no privado. No entanto, nem todas estão a seguir estas regras. A confusão gerou-se pelo facto de, em 2013, o Governo ter decidido cortar ou eliminar o 14º mês dos trabalhadores do Estado, incluindo neste universo os que estão ao serviço de empresas e de supervisores. O subsídio acabou por ser pago, na sequência do chumbo do Tribunal Constitucional. Como a Lei 11/2013 foi inicialmente apresentada pelo executivo como estando destinada ao sector privado para mitigar o aumento da carga fiscal, a sua aplicação nestas entidades públicas não está a ser uniforme. A Caixa Geral de Depósitos (CGD), a Estradas de Portugal, a Metro do Porto, a Transtejo, o Instituto Nacional da Aviação Civil (INAC) e a Autoridade Nacional das Comunicações confirmaram nesta terça-feira ao PÚBLICO que vão manter o regime da função pública, ou seja, pagar o 14º mês na íntegra. O mesmo se passa na TAP e, ao que foi possível apurar, na Águas de Portugal. Do lado oposto estão a Imprensa Nacional Casa da Moeda, a CP, a Refer, a RTP, a Carris e Metro de Lisboa, que entenderam que devem seguir o privado nesta matéria, visto que se regem pelo Código do Trabalho. Já a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) referiu que a administração “solicitou um parecer jurídico sobre a aplicação das normas” e que “o que resultar desse mesmo parecer será aplicado com a participação e audição dos trabalhadores se necessário”. Na Carris e na Metro de Lisboa, que foram alvo de uma fusão operacional em 2012, será cumprida a lei dos duodécimos para o pagamento do subsídio de férias, "salvo a legislação em vigor venha a determinar o contrário", referiu nesta quarta-feira o grupo em resposta a questões do PÚBLICO. Além das dúvidas geradas pelo facto de a lei dos duodécimos não ter sido aplicada logo quando entrou em vigor, em 2013, a confusão instalou-se também porque, no que diz respeito ao subsídio de Natal, as empresas públicas e os reguladores seguem a função pública. Isto porque a diluição do 13º mês ao longo do ano é uma imposição que consta no OE, sobrepondo-se a qualquer outra norma ou acordo laboral. E, pior, nestas entidades existe muitas vezes um universo heterogéneo de trabalhadores, coexistindo acordos individuais de trabalho e acordos de trabalho em funções públicas. Ou seja, no limite, poderia haver casos em que teriam de aplicar a Lei 11/2013 para alguns casos e as regras do Estado para outros. É o que se passa, por exemplo, na ERSE, que referiu que “as normas deixam dúvidas sobre a aplicação a entidades onde vigoram, em simultâneo, o regime da função pública e o contrato individual de trabalho, mas com carreiras integradas”. Já no INAC, o tema não se coloca neste momento, visto que todos os trabalhadores deste regulador estão abrangidos, desde 2008, pelo contrato de trabalho em funções públicas. E, por isso, serão seguidas por agora as regras no Estado no pagamento dos subsídios de férias e de Natal. No entanto, esta situação deverá mudar em breve, já que, com a entrada em vigor dos novos estatutos (na sequência da publicação da Lei-quadro das entidades reguladoras, que transforma o INAC em Autoridade Nacional da Aviação Civil), todos os trabalhadores passarão a estar abrangidos pelo contrato individual de trabalho, o que significa que terá de ser aplicada a Lei 11/2013 (ou seja, metade do 14º terá de ser pago em duodécimos). Violação da lei Os especialistas em direito laboral contactados pelo PÚBLICO não têm dúvidas. Nos casos em que estas entidades públicas se regem pelo Código do Trabalho, a lei dos duodécimos tem de ser aplicada. Claúdia do Carmo Santos, da sociedade de advogados Miranda, entende que “qualquer acção das empresas públicas e reguladores com contratos individuais de trabalho que não esteja em conformidade com o diploma constitui uma violação”. Já Tiago Cortes, da PLMJ, referiu que “se trata da uma alteração legislativa que tem de se aplicar nestas entidades [que se regem pelo Código do Trabalho], constituindo uma contra-ordenação muito grave” a não aplicação destas regras, como prevêem os artigos 3º e 4º da Lei 11/2013. O PÚBLICO questionou o Ministério das Finanças sobre o facto de algumas empresas públicas e entidades reguladoras não pretenderem pagar metade do subsídio de férias em duodécimos e sobre se iria tomar alguma medida. No entanto, não obteve resposta. A tutela de Maria Luís Albuquerque tinha confirmado na segunda-feira que “as empresas públicas regem-se pelo Código do Trabalho e não pelo Código do Trabalho em Funções Públicas, portanto estão obrigadas a seguir estas regras” previstas na lei dos duodécimos. O PÚBLICO sabe que algumas destas entidades estão a aguardar por algum sinal das Finanças para tomarem uma decisão sobre esta matéria. O processamento de salários só ocorrerá a partir de meados de Janeiro, embora o prazo para os trabalhadores decidirem se querem receber o subsídio de férias na íntegra ou em duodécimos já tenha terminado na segunda-feira. Há, no entanto, empresas públicas que prolongaram o prazo da decisão, como aconteceu na RTP, onde os funcionários “poderão manifestar a sua opção até 15 de Janeiro”, esclareceu a estação de televisão do Estado. Caso não seja adoptado um regime uniforme nas empresas públicas e nos supervisores, vai criar-se uma situação desequilibrada, em que alguns trabalhadores passam a ter direito a receber um subsídio e meio em duodécimos (50% do 14º mês e a totalidade do 13º) e outros continuam a auferir apenas o subsídio de Natal ao longo do ano. Foram ainda questionadas sobre este tema a Parpública, a Parque Escolar, a Administração do Porto de Lisboa, a Autoridade da Concorrência, o Instituto de Seguros de Portugal e a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, mas não houve resposta.

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